Depressão: mais de 300 milhões de pessoas sofrem com a doença

Depressão: mais de 300 milhões de pessoas sofrem com a doença

Apesar de ser considerada um transtorno comum, mas sério, que interfere na vida diária, na capacidade de trabalhar, dormir e aproveitar a vida, a depressão ainda é vista como uma doença repleta de estigmas sociais que prejudicam o seu diagnóstico e tratamento – assim como outros transtornos mentais. Causada por uma combinação de fatores genéticos, biológicos, ambientais e psicológicos, a depressão pode ter longa duração e, dependendo da intensidade, pode virar uma crítica condição de saúde. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), haveria mais de 300 milhões de pessoas, no mundo com a doença. Na América Latina, o Brasil é o país com mais casos e esse índice aumentou durante a pandemia.


Para a psicanalista e psicóloga Renata Bento, membro da Sociedade Brasileira de Psicanálise do Rio de Janeiro, o estigma social em torno da depressão (e dos transtornos mentais, em geral), é um dos obstáculos para se iniciar um tratamento adequado que, se não acontecer a tempo, pode levar ao suicídio. “Ainda assim, é comum as pessoas associarem a doença à coisa de gente fraca, à falta de fé e até desmerecê-la em quem, aparentemente, é socialmente bem sucedido e possui beleza, família, dinheiro e trabalho. Como qualquer outra doença, a depressão pode acometer qualquer pessoa. Mas, justamente por conta do estigma, muitos indivíduos ainda sentem vergonha quando descobrem que estão com a doença”, observa a especialista.

Segundo ela, há quem diga até que o tratamento psicológico é coisa de maluco. “Coisa de maluco é sentir dor na alma e não conseguir traduzir isso em palavras. Ser gente não é nada simples, porque gente sente, sofre, tem conflito, sentimentos ambivalentes, traumas e, em algum momento da vida, pode sucumbir”, diz.

Renata afirma que pessoas com a doença também sentem medo de, ao precisar de uma medicação, que isso possa transformá-la em ‘outra pessoa’ ou ainda, que possa trazer dependência. “É importante sempre ressaltar que um profissional adequado de saúde mental ajudará a destrinchar as fantasias que giram em torno do tratamento, o que pode trazer confiança e segurança ao processo”, esclarece.

Sintomas da depressão

A especialista explica que os sintomas são notícias contadas por meio do corpo; uma forma de expressão de que algo não vai bem e é preciso olhar para isso. No caso da depressão, há uma angústia em busca de um sentido. Só que na tentativa de expulsar essa angústia, de não conseguir senti-la, algumas pessoas podem criar novos problemas, como o uso abusivo de álcool e drogas. “Esse artifício barulhento de substâncias anestesiadoras só tem um objetivo: aumentar a dose, porque enfraquece emocionalmente ainda mais a pessoa, e pode camuflar uma depressão de base, fazendo com que a depressão não seja tratada e as substâncias falsamente apaziguadoras passem a ser, por seu excesso, o foco central do problema”, ressalta.

De acordo com ela, os sintomas podem ser os mais diversos: irritabilidade, euforia, perda do sono, humor exaltado, angústia, excesso de atividades, sonolência, diminuição das atividades, perda do apetite, excesso de apetite, entre outros. “Também pode ser desde um estado que paralisa a pessoa até um estado de euforia. Por isso, é importante a distinção do tipo de depressão, se é leve, moderada ou grave, se é crônica, se existem muitos episódios de recaída, se foi o primeiro episódio, enfim, uma minuciosa análise. A depressão rói a pessoa por dentro, e aos poucos tira sua funcionabilidade sem que se perceba. Quando se vê, já foi”, alerta.

Para minimizar os sintomas, Renata lembra que o acompanhamento psicológico é necessário em todos os tipos de depressão. Em muitos casos, recomenda-se, ainda, a medicação, com acompanhamento medico e atividade física regular. “O benefício da atividade física está no fato de o cérebro liberar neurotransmissores – endorfina, dopamina e serotonina – e estes ajudam a aliviar os sintomas da depressão”, destaca.

Pode parecer estranho recomendar atividade física a quem está deprimido e não consegue, por exemplo, sair de casa. Nesse caso, o início do acompanhamento psicológico e a medicação podem ajudar muito na contenção dos sintomas e no retorno da funcionabilidade da pessoa, incluindo o inicio, retorno ou manutenção do exercício físico. “Quanto mais cedo a doença for detectada, melhor pode ser o prognóstico. Com o tratamento adequado, aos poucos a pessoa começa a se sentir melhor e essa escuridão interna vai dando lugar à esperança de dias melhores e mais claros, e a vida de dentro volta a se encontrar com a vida de fora”, afirma Renata.

Quem desenvolve a depressão

A origem da depressão, segundo a especialista, é multifatorial, tais como mudanças biológicas no nível de neurotransmissor, ambiental, de genética, e de fatores psicológicos e sociais. Isso quer dizer que a genética, de forma isolada, não será suficiente para desenvolver a doença. “A pessoa pode ter propensão a doença, mas não desenvolvê-la durante sua vida”, explica.

Renata lembra ainda que a depressão pode afetar a todos, indiscriminadamente e em qualquer faixa de idade. Além disso, apresenta quadros diferentes quanto à duração e à intensidade. “Por isso, o apoio familiar é fundamental durante o tratamento. Mas não é fácil para a família lidar com a falta de vivacidade e o pessimismo que invade o doente. A depressão impõe ao doente uma espécie de paralisação diante da vida, e a pessoa vai se escondendo do mundo, sem perceber. Muitas vezes até a pessoa aceitar que precisa de ajuda, leva um grande tempo. A pessoa não acredita que está doente, e acha que o mundo não consegue vê-lo e isso pode ser motivo de muitas discussões em casa”, comenta.

Tem cura?

A psicanalista e psicóloga explica que, quando se fala em episódio depressivo, este, quando tratado, pode levar à remissão dos sintomas e a pessoa voltar a sua funcionalidade anterior ao episódio. “Isto quer dizer que a depressão não tem cura, mas, sim, tratamento. Uma pessoa pode ter um único episódio depressivo e depois não ter mais, ou ter outros episódios durante a vida. Mas, uma pessoa que já teve um episódio depressivo tem o risco maior de ter sintomas depressivos no future. Por isso é importante saber qual o tipo de depressão. Com o tratamento adequado, psicológico e médico, é possível retomar a uma vida funcional”, orienta Renata.

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